ARTE BOA, ARTE RUIM: ISTO EXISTE?

30/06/2015 11:03

Frederico Spencer

 

Há uma discussão nos meios acadêmicos e literários, não tão atual assim, sobre a qualidade da arte que consumimos hoje. Tal movimento divide-se em dois blocos: um atribui a força do mercado como formador de uma arte dirigida para o consumo de massa, prejudicando desta forma a sua qualidade. O outro defende que hoje consumimos uma arte decadente e que, neste contexto, pesam vários fatores determinantes para a sua produção.

Colocando-se de lado questões inerentes à qualidade, duas artes então, permeiam nosso cotidiano, alimentando e transformando-nos através de sua veiculação nos meios de comunicação.

Essas artes, conceitualmente geradas para atender nichos de mercado, não se cruzam e não se permeiam ao final de sua produção, provocando ainda mais uma discriminação, o que impede um estudo aprofundado sobre o tema, diminuindo desta forma o conceito de arte - sua força e sua destinação, que é a criação de novos conceitos estéticos para entendimento da realidade que nos rodeia.

O poeta Ferreira Gullar em seu livro: “Sobre arte. Sobre poesia. (Uma luz no chão)”, nos diz que “A produção da arte como acontecimentos ou conceitos, se podem ser entendidas como resultado da procura estética, podem também ser vistas como resultado do conflito subjacente entre arte como expressão e a arte como mercadoria”.

Levando-se em consideração, de certa forma, o conceito ortodoxo marxista sobre arte, o qual se fundamenta na questão de que a arte é a representação dos interesses e a visão de “mundo” de determinadas classes sociais, ainda mais lenha vem adicionar a esta fogueira.

O filósofo Herbert Marcuse, aponta para além deste modelo estético, quando afirma que a arte se sobrepõe a este papel político, porque ultrapassa as fronteiras que a cerceia: “Na sua autonomia a arte, não só contesta essas relações sociais existentes como, ao mesmo tempo, as transcende. Deste modo, a arte subverte a consciência dominante, a experiência ordinária”.

Podemos entender então que a criação artística, mesmo sendo produto de um tempo histórico, escapa das rédeas desse tempo, alcançando sua autonomia através do diálogo permanente, que faz com as relações de produção e as questões subjetivas do humano, que permeiam o homem na sua escalada evolutiva, através dos questionamentos vivenciados em seu meio.

Desta forma a produção artística, posto que é resultado da cultura de um povo e ainda seu meio de manifestação, nos aponta para questionamentos - qual uma bússola à indicar um caminho sobre a qualidade de vida de um determinado povo: suas relações de produção,  seu grau de conhecimento tecnológico e erudito.

Conforme o escritor Raimundo Carrero: “o conceito estético grego morreu, já não existe, hoje extraímos a arte da história da vida das pessoas simples, das ruas descalçadas”. Portanto não existe arte ruim nem arte boa, o que muda é o conceito de vida que se desenrola no carretel dos dias, impregnados pelas mudanças dos mercados e pelas aflições geradas por estes.

Segundo a música: Ela é dançarina, de Chico Buarque: “eu sou funcionário/ela é dançarina/quando pego o ponto/ela termina/Ou: quando abro o guichê/é quando ela baixa a cortina”. Simplesmente vivemos, produzimos, somos resultado de nossas ações culturais, portanto de aquilo que nos permeia.